Portos: de quem e para quem?
- Flavia Nico
- 4 de mar. de 2020
- 2 min de leitura
Um novo mindset que alavanque todo o potencial dos portos deve enxergá-los como ativos do território
Nesse atual momento da reforma portuária, alguns cenários começam a ficar mais distantes e outros vão se formando. No Seminário sobre Sistema Portuário Capixaba (03/03/20), o secretário de portos, Diogo Polido, destacou os motivos para a desestatização - as tradicionais metas de eficiência, custos, competitividade – e as várias iniciativas para destravar o setor. A fluidez almejada para os portos é pensada dentro do mindset tradicional: logística e gestão.
Coube ao presidente da Codesa, Julio Casteglioni, apontar alguns dos direcionamentos do que deve acontecer com o Porto de Vitória e, provavelmente, com os demais portos públicos brasileiros: a revisão da balança entre o que é público e o que é privado dentro dos portos. Nas visitas que realizou com equipe do Porto de Vitória à países estrangeiros, destacou a perplexidade espanhola frente ao questionamento se um porto deve ser público ou privado. Para eles, não há o que se debater: o porto é público, mas sua gestão é “corporativa”. A coisa pública é o que diz respeito à nação em sua visão mais clássica: defesa nacional e soberania. A esfera do privado é a de entrega ao mercado daquilo que lhe é próprio por natureza: a reprodução do capital.
Encontrar o equilíbrio ideal entre política e economia é um desafio infinito, reajustável a cada tema, lugar e conjuntura. Complexidade digna dos portos, que são tanto locais quanto globais, que aglomeram interesses tão variados que têm toda uma comunidade para chamar de sua: a comunidade portuária. A participação da FINDES na proposição de evento de discussão dos portos capixabas é reveladora de como a própria comunidade se apodera dos potenciais dos portos para sua dinâmica econômico-empresarial.
A mensagem final do dia veio de rica conversa que tive posteriormente com o consultor portuário chileno Luis Marcelo Ascensio, que disse a verdade que de tão óbvia se perde: “os portos são atemporais”. De fato, os portos não deveriam ser pensados como ativos do Estado, e muito menos de governos específicos. Tampouco a comunidade portuária se restringe àqueles ligados diretamente ao porto ou aos que estão na zona portuária. Os portos são parte de clusters variados, acionados com a construção de relações de confiança na comunidade portuária.
Repensar os portos precisa ir além de definir quem faz o quê. Reposicionar os portos deve ir além da visão autocentrada da sustentabilidade econômica do negócio. Reconstruir os elos entre os portos e a comunidade portuária requer ir além dos muros do morto, da comunidade vizinha, dos fornecedores diretos. Portos são ativos do território, se inseridos numa agenda de desenvolvimento econômico podem fazer com que a cidade seja, também, mais competitiva.

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